Adaptado por Zootecnista Henrique Costa Filho, MSc
Consultor Técnico Sustennutri
Fonte: Embrapa – Brasil em 50 Alimentos – 2023
Nesse excelente material produzido pela Embrapa em comemoração aos
seus 50 anos, é contada a história, desde 1532, até nos tornarmos o 3º
maior produtor mundial, com produção de mais de 35 bilhões de
litros/ano.
O leite é o alimento mais consumido no mundo, constituindo-se em fonte vital de
nutrientes para a população. Com elevado valor nutritivo, o leite é rico em proteínas,
gorduras, carboidratos, sais minerais, vitaminas e compostos de alta digestibilidade.
São inúmeros os produtos lácteos consumidos mundialmente, com destaque para
queijo, manteiga, creme de leite, iogurte, leite condensado, além dos leites fluido e em
pó. No Brasil, a pecuária surgiu em 1532 quando desembarcaram os primeiros 32
bovinos de origem europeia. A atividade permaneceu sem grande expressão por mais
de três séculos, quando, a partir do final do século XIX, com a decadência do café nas
lavouras e a abolição da escravatura, a pecuária se expandiu do Sul ao Nordeste nos
arredores dos grandes centros consumidores. Atualmente, a produção de leite é uma
das principais atividades econômicas e sociais, sendo responsável pela geração de
emprego e renda para milhões de pessoas. Com uma produção de mais de 35 bilhões
de litros anuais, o Brasil é o terceiro maior produtor mundial, atrás apenas dos Estados
Unidos e da Índia. Produzido em quase 98% dos municípios brasileiros, o leite tem
como principais estados produtores Minas Gerais, Paraná, Rio Grande do Sul, Santa
Catarina e Goiás, que juntos respondem por 70% da produção nacional. Diferente de
outros produtos do agronegócio brasileiro, em que o País se destaca dentre os maiores
produtores e exportadores mundiais, o leite brasileiro destina-se em quase sua
totalidade para o mercado interno. A indústria de laticínios é o segundo segmento
mais importante da indústria de alimentos no País e tem evoluído na busca de atender
os anseios dos consumidores atuais. Exemplos são os produtos funcionais (que
oferecem benefícios à saúde, além de suas funções nutricionais básicas); os produtos
regionais, notadamente os queijos com certificados de origem; e os produtos
especializados para grupos especiais (leite sem lactose, leite A2A2, produtos com alto
teor de proteína do soro do leite “whey protein”).
Mais leite via ganhos de produtividade
A atividade leiteira no Brasil passou por uma grande evolução nas últimas cinco
décadas. De 1974 a 2021, a produção de leite cresceu 397%, passando de 7 bilhões
para mais de 35 bilhões de litros anuais. Já o rebanho de vacas ordenhadas cresceu
apenas 47%, sendo que, na última década, tem ocorrido uma queda consistente nesse
indicador, que hoje é de 16 milhões de animais, o mesmo que no início da década de 1980.
Essa relação se refletiu no aumento da produtividade animal, que cresceu 238%
no período, atingindo 2.214 litros/vaca. Esse aumento expressivo da produção, bem
acima do nível de crescimento da população, permitiu ao País saltar de um consumo
anual de 100 L para 170 L em quatro décadas, disponibilizando mais leite a um menor
custo para a população. Esses avanços foram possíveis devido aos ganhos de
produtividade dos recursos empregados na atividade. Contribuições da ciência para
aumento da eficiência O papel da ciência brasileira foi preponderante para permitir
essa revolução na atividade leiteira nacional. Na década de 1970, as instituições de
pesquisa já contribuíam com a introdução de tecnologias adaptadas ou testadas em
condições tropicais. Uma das principais contribuições veio do melhoramento genético
animal, que se iniciou pela pesquisa do mestiço leiteiro brasileiro e de estratégias de
cruzamentos, seguida pelo pioneirismo na seleção da raça Gir Leiteiro. Na sequência,
vieram os trabalhos de seleção para leite na raça Guzerá e na raça tropical brasileira, o
Girolando, que conferiram um grande avanço de produtividade nessas raças. A
pesquisa também atuou na avaliação genética nas raças Holandesa e Jersey. Essa
melhoria genética dos animais, aliada aos avanços na área de reprodução, permitiram
ao Brasil avançar de forma consistente na produtividade animal com a disseminação
de genética superior adaptada às diferentes regiões do País. Outro grande avanço foi o
melhoramento genético de plantas forrageiras. Até o início da década de 1980, os
sistemas pecuários no Brasil eram predominantemente extensivos, tendo como base o
uso de pastagens de gramíneas pouco produtivas e de baixo valor nutricional, o que
resultava em baixas taxas de lotação e reduzido desempenho animal. Atualmente, as
cultivares melhoradas associadas ao manejo adequado das pastagens se expandiram
por todos os biomas nacionais. A adoção de diferentes sistemas de produção, com
destaque na última década para o compost-barn, associados ao desenvolvimento
tecnológico na área de nutrição animal com o melhor entendimento das exigências
nutricionais de bovinos em condições tropicais e a produção de alimentos em
quantidade e qualidade permitiram maior intensificação da atividade com avanço na
produtividade da terra, resultando na produção de uma quantidade muito maior de
leite na mesma área. Avanços também foram conquistados no campo da qualidade do
leite, impulsionado pelo Programa Nacional de Melhoria da Qualidade do Leite, no
qual a pesquisa brasileira teve fundamental participação.
O programa permitiu alinhar os padrões nacionais de qualidade aos adotados
internacionalmente, que juntamente com a adoção de boas práticas de produção e o
adequado controle sanitário dos rebanhos, resultaram na disponibilização de produtos
de maior qualidade e mais seguros para a população. A ciência também teve papel
importante na estruturação da cadeia de produção do leite e no aumento de sua
competitividade por meio de estudos econômicos que balizaram a formulação de
políticas públicas, bem como forneceram subsídios à tomada de decisão dos agentes
da cadeia por meio de estudos conjunturais de mercado.
Novos desafios e oportunidades
A ciência brasileira continua trabalhando para o desenvolvimento de novas soluções tecnológicas convergentes. A seleção genômica tem sido um marco que coloca o país na liderança mundial em melhoramento genético tropical. A pecuária de precisão marca a era dos sensores, onde a tecnologia para mensurar indicadores produtivos, fisiológicos e comportamentais em tempo real já é uma realidade. O uso de geotecnologias avança para permitir o monitoramento das condições das pastagens em larga escala, criando as bases para a criação do zoneamento pecuário. A nanotecnologia, as biotécnicas reprodutivas e a bioenergética também são exemplos de novas áreas de pesquisa aplicada. Por fim, tem-se uma grande demanda por avanços na área da sustentabilidade, em todas as suas vertentes, que pode ser sintetizada na bioeficiência dos sistemas de produção. Esse conceito busca aliar a eficiência produtiva e econômica, com a produtividade e bem-estar animal e da mão de obra empregada, eficiência alimentar e energética, uso racional de medicamentos e de água, redução da geração de resíduos e menor pegada de carbono. A ciência brasileira já está atuando nesses novos desafios de modo a permitir que o setor possa produzir cada vez mais leite, com maior eficiência e sustentabilidade.